Democracia Racial

Enviado por aarquivista, qui, 2020-11-26 10:41

São Paulo

Democracia Racial
Pedro Guimarães

Índio, branco e negro. Mameluco, cafuzo e mulato. Mestiços. A mestiçagem criou no Brasil uma sensação de harmonia e acomodação dos diferentes povos que constituíram esse povo, povo brasileiro. Uma aparente afetividade entre os diferentes. Diferente dos Estados Unidos ou da África do Sul, aqui nunca se separou (pelo menos declaradamente) bairros para brancos e negros, escolas para negros e brancos, banheiros para brancos e negros empregos para negros e brancos. Emprego? Bem se falando em trabalho a divisão não parece tão diferente assim da dos Estados Unidos e da África do sul. Herdamos da colonização Portuguesa uma hipocrisia de nos intitularmos todos amigos, por mais que os nossos interesses e participação na sociedade seja radicalmente opostos, e um sentimento de superioridade de uns para com os outros.
O branco, pode ser rico e católico e ter como seu melhor amigo, você que é negro, pobre, macumbeiro ou evangélico, que é neto do escravo do avô dele e que mesmo assim é tão superior, que isso não interfere no fato dele te considerar o melhor amigo dele. Desejar tua malicia, sua esperteza e a capacidade que possui de conseguir escapar e dar jeito nas tantas situações difíceis que a vida lhe reserva.
O mestiço por sua vez vive a não identidade cultural, e é isto que o identifica, quando indagado por sua cor não sabe se moreno, pardo, mulato, marrom, chocolate ou cor de burro quando foge, e aí reside sua grande vantagem dependendo da circunstância pode se passar por branco, negro ou índio, conforme o que lhe for conveniente, e isso toma-lhe a alma e mente de forma tão sinistra que ele acaba fazendo uso desse efeito camaleão  sem se dar conta, e vai tornando-se vítima de sua própria esperteza. Dessa forma mesmo tendo sangue índio e negro acaba não ajudando estas populações pois no momento em que se vê obrigado a se posicionar racialmente, assume só seu lado branco, pois no Brasil o sonho de todos (até da elite) é ser branco.
O negro brasileiro, como diz o filósofo Jorge Mautner perdoou quem o escravizou. Se considera parte integrante da sociedade brasileira, e realmente é. Principalmente no que diz respeito a contribuição no jeito de andar, falar, comer e se comportar de todo nosso povo, mas não consegue participar dos centros de tomada de decisão (poder) e do desfrute da riqueza (na sua grande maioria). Acredita ser amado pelos não negros, e faz de tudo para mostrar o quanto soube seguir os bons exemplos dados pelo mundo ocidental.* Pois no Brasil os méritos e valores dos negros são reconhecidos desde que se possa esconder que são de pessoas negras. O negro, tanto honrosa ou criminosamente quer enriquecer, pois enriquecer é quase se tornar branco e dessa forma toda sorte de humilhações raciais que você passou na vida serão recompensadas.
Observamos hoje nas grandes cidades uma inversão total de valores, enquanto as igrejas evangélicas, que têm raiz no protestantismo europeu do século 16, ameaçam os terreiros de umbanda e candomblé tomando-lhes cada vez mais seu fiéis: a classe média branca e intelectualizada, procura cada vez mais esses mesmos terreiros abandonados por negros e mestiços. Talvez a democracia racial seja possível através desta contradição.
*Os irmãos Rebouças e o Teodoro Sampaio são lembrados como grandes engenheiros e esquecidos como negros.

 


2004


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