Proposta de disciplina para PPGAV-IA-UFRGS 2018
Título da disciplina
Pesquisa, institucionalidades e articulações estético-políticas
Ministrante
Dra. Cristina Thorstenberg Ribas
Carga Horária 45h/aula
15 encontros de 3h cada
Ementa e objetivo
A disciplina discute práticas de pesquisa e produção do conhecimento em relação com produções estéticas e curatoriais articulando-as a teorias e práticas que reconceitualizam a noção de pesquisa e adotam a perspectiva da processualidade em relação à produção de subjetividade. É endereçada a pesquisadores dos campos da curadoria, da história teoria e crítica, a artistas e mais estudantes e profissionais de outras áreas. Vamos olhar com atenção para a “crítica institucional” (Fraser, 1996; Sheikh, 2006, 2009) e criar linhas de análise com conceitos desenvolvidos por Félix Guattari (1992) em relação à pesquisa e à militância, e como ele propunha uma articulação entre estética, política e instituições. Também vamos estudar a “análise institucional” (Lourau, 1992; Guattari, 1987; Rodrigues, ), desenvolvida desde os anos 70 em diversas instituições acadêmicas e observar que contribuições ela traz para a pesquisa e para a crítica institucional, também no que concerne um pensamento renovado sobre processos grupais e institucionais e suas intersecções com a produção estética. As produções estéticas que vamos estudar são projetos, iniciativas, espaços e plataformas auto organizadas, bancos de dados e agenciamentos da produção na internet, assim como redes de produção que articulam pesquisa, estética e política criando novas formas de realização, produção historiográfica, institucionalização e realização da arte contemporânea, também em transversalidade com outras práticas e campos do conhecimento. A disciplina quer pensar contemporaneamente a pesquisa acadêmica, difundindo produção teórico-prática sobre a processualidade da criação e da subjetivação na produção do conhecimento, enfrentando capturas e impasses da atualidade.
Método e avaliação
Como estratégia de ensino a disciplina dispõe de aulas expositivas dialogadas, realização de seminários, análise e discussão de projetos de pesquisa das e dos pós-graduandos. A avaliação do processo será dada por meio da participação e da integração das alunas e dos alunos com o tema da disciplina, através da apresentação comentada de textos e produção de relatos críticos considerando os temas tratados em aula. Sugiro a realização de três relatos críticos (até duas laudas) ao longo das 30h de aula (um a cada três semanas, em média).
Se fizer parte da estrutura do PPGAV uma avaliação final da disciplina, proponho às alunas e alunos escreverem relatórios ou cartografias parciais de sua pesquisa em relação ao tema da disciplina (formato de artigo ou em formato de narrativa pessoal, até 12 laudas), e se possível a concepção de um projeto ou processo-piloto que permita uma articulação produtiva entre pesquisa em arte, produção do conhecimento e processos de subjetivação.
Programa das aulas
Aula 01
Apresentação do curso de noções de pesquisa que emergem de atualizações institucionais a partir da filosofia pós-estruturalista e do encontro entre análise e crítica institucional. Perspectivas do norte global e do sul global. Passagem sobre autores de referência. Escuta dos interesses das e dos participantes.
Aula 02
Introdução ao trabalho de Félix Guattari e junto de Gilles Deleuze e a noções de estética e política em relação à subjetivação, à militância e à pesquisa. Contribuições da filosofia contemporânea no pensamento de práticas artísticas, desde a arte minimalista, conceitual, processual e contemporânea e contribuições da arte para o desenvolvimento da filosofia pós-estruturalista. Relações entre pesquisa e produção estética. Atualizações dessas perspectivas contemporâneas a partir do norte global: Brian Holmes, Simon O'Sullivan, Claire Bishop.
Aula 03
Transversalidade, Caosmose e Três Ecologias. O “paradigma ético-estético” e os “agenciamentos coletivos de enunciação” de Guattari e suas proposições transversalistas. Contexto francês e participação de Guattari em movimentos organizados na França (CERFI, FGERI, entre outros) e na criação de grupos transversais de pesquisa (Revista Recherches). Quais são as proposições de Guattari para as instituições? Como Guattari pensou os processos de subjetivação em relação às instituições e modos instituintes? Como Guattari pensou a produção estética em relação à produção de conhecimento, pesquisa e militância?
Aula 04
Difusão da cartografia esquizoanalítica no Brasil. O trabalho de Suely Rolnik e de Peter Pál Pelbart no Núcleo de Subjetividade da PUC e na saúde mental. Programas de pós graduação em psicologia clínica e social em universidades públicas no Brasil. Que transversalidades são propostas aí? Que modificações da estrutura institucional se operam? Que novas metodologias? Que propostas surgem em relação aos processos grupais e institucionais? Qual a participação dos processos estéticos nesse arranjo institucional e de produção do conhecimento?
Aula 05
Contexto do norte global, relações e proposições institucionais. Hans Haacke, o grupo de Nova Iorque, Black Mountain College. Aprendizagens a partir de Michel Foucault na concepção da sociedade de controle e proposições que surgem: artistas, configurações institucionais, historiografias. A crítica institucional de Andrea Fraser nos anos 90 e dez anos depois. Como se pode pensar esse contexto em relação à América Latina? Que sincronicidades ou diacronias?
Aula 06
Pesquisa em arte, arte como pesquisa. Produção teórica e prática do norte global. De Marcel Duchamp a Art & Language. O trabalho teórico e institucional de Simon Sheikh. As proposições de Jakob Jakobsen a partir da anti psiquiatria: non-knowledge, anti-history, hospital-prison-archive-university. Quais outras proposições emergem? Que propostas surgem aí entre pesquisa e produção estética, e ainda – produção de conhecimento? Que diferenças com o contexto brasileiro e latino americano?
Aula 07
Redes de produção do conhecimento e militância pelo direito à educação superior. Abertura de relações transversais entre instituições e iniciativas auto-organizadas, estudo coletivo do contexto Europeu e redes européias e Latino Americanas. Estudos de Caso: Edu-factory (Europa) e Rede Universidade Nômade (Brasil). O que está em jogo com a privatização do conhecimento? De que maneira o paradigma ético estético e a transversalidade em Guattari vão recolocar esse problema?
Aula 08
A produção de um artista-etc., e entre eles, de um artista-pesquisador. O trabalho teórico-poético de Ricardo Basbaum. De que maneira o artista abre novas funcionalidades e gera efeitos no circuito e no campo da arte e afins? De que maneira se pode atualizar a figura do artista-pesquisador? Quais as articulações e proposições de Basbaum na articulação entre produção estética e do conhecimento? Quais limites se apresentam? Como ultrapassar esses limites?
Aula 09
Produção de arte no Brasil do final da década de 90, o ciclo dos coletivos, a re-tomada do espaço público e os espaços de produção coletiva. O que foi esse ciclo? O que ele trouxe de crítica e de contribuição ao circuito de produção de arte? Que iniciativas de pesquisa e inserção crítica e historiográfica surgiram junto e após esse ciclo? A Revolução não será televisionada, Coletivos no Prestes Maia, Rejeitados e mais.
Aula 10
Redes de co-produção e pesquisa. De que forma as redes repensam estruturas institucionais e criam novas formas de cooperação entre pesquisadores? Estudos de caso: Mídia Tática Brasil, Digitofagia, Submidialogias e outros festivais de produção ativista, de arte, e de mídia. Redes e coletivos de artistas dos anos 2000 a partir da perspectiva da co-produção e da articulação entre produção de conhecimento e produção estética.
Aula 11
Mais sobre redes e co-produção de mídia e internet no Brasil. Que pesquisas relacionam essa produção com a arte contemporânea? Que passagens de saber, que práticas elas instituem e em diferença a que formas e normas da produção autoral e do circuito institucional de museus e galerias? Leitura de textos de autoras envolvidas no contexto de produção de ferramentas, internet e software livre, tais como Giseli Vasconcellos e Fabiane Borges. A pesquisa de Ana Maria Maia.
Aula 12
Projetos de arquivo, memória, produção e agenciamento de conhecimento sobre práticas artísticas e análise institucional. A trajetória do Arquivo de emergência ao Desarquivo.org. E outros projetos e iniciativas de pesquisa. A Red Conceptualismos del Sur [http://www.redcsur.net], rede de pesquisadores trabalhando com arte conceitualista e pós-conceitualista da América Latina e de artistas latino americanos. De que maneira essas redes e plataformas se colocam como novas instituições e estabelecem novas éticas de produção e pesquisa?
Aula 13
Outros projetos recentes no Brasil que tem gerado plataformas de produção de saber comum nas linhas da transversalidade, da análise institucional e do pensamento pós colonial e de colonial. Levantamento coletivo junto aos alunos. Reflexões sobre metodologias possíveis de pesquisa e produção.
Aula 14
Seminário de apresentação das e dos participantes, considerações finais da disciplina.
Aula 15
Seminário de apresentação das e dos participantes, considerações finais da disciplina.
*
Bibliografia
(para ser atualizado, também conforme o calendário de aulas)
Barros, R. B., e E. Passos, 2009. “A cartografia como método de pesquisa-intervenção”. Em: Escossia, L; Kastrup, V; Passos, E. (org) Pistas para o método da cartografia. p. 28.
Barros, R. B., and E. Passos, 2003, “A Instituição e sua borda”. In: Fonseca, T. G. & Kirst, P. Cartografias e devires: a construção do presente. Porto Alegre: Ed. UFRGS
Basbaum, R., 2007. Além da Pureza Visual. Porto Alegre, Editora Zouk. ________, 2008. “O artista como pesquisador”. Em: Concinnitas No. 9. Rio de Janeiro, Instituto de Artes/UERJ.
Basbaum, R. Manual do artista-etc. Rio de Janeiro: Ed. Azougue, 2013.
Belisário, A. E Borges, F. Ideias Perigozas. Submidialogias. São Paulo: (Des)Centro, 2009.
Borges, Fabiane. Domínios do Demasiado. São Paulo: Editora Hucitec, 2010
Crabbé, O., Muller, T. And Vercauteren, D., 2011, Micropolíticas de Los Grupos: Para una Ecología de Las Prácticas Colectivas. Madrid: Traficantes de Sueños
Deleuze, Gilles; Guattari, Félix. Mil platôs - capitalismo e esquizofrenia. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1995.
Escobar, C., 1974. "As instituições e o poder". Em: As Instituições e os Discursos. Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro. (p. 3-33)
Escossia, L; Kastrup, V; Passos, E. (org), 2009, Pistas para o método da cartografia. Porto Alegre, Sulina.
Foster, H, O Retorno do Real. São Paulo: Cosac Naify, 2014.
Fonseca, T. M. G., Nascimento, M. L. and Maraschin, C., (ed.) 2012, Pesquisar na diferença: um abecedário Porto Alegre: Sulina
Freire, Cristina e Longoni, Ana (org.). Conceitualismos do Sul/ Conceptualismos del Sur. São Paulo: Annablume / MAC-USP, 2009
Guattari, F, 1992, Caosmose: Um novo paradigma ético-estético. Ed. 34, São Paulo ________, 2006, Anti-Oedipus Papers, Los Angeles/ New York: Semiotext(e)/ Foreign Agents / The MIT Press
________, 1987. “Transversalidade”. Em: Revolução Molecular. Pulsações Políticas do Desejo. São Paulo: Brasiliense
Fraser, A. 2005, “From the Critique of Institutions to an Institution of Critique. Artforum. New York: Sep
2005. Vol. 44, Iss. 1; pg. 278, 8 pgs
________, 2013, Schizoanalytic Cartographies. London, New York: Bloomsbury Academic Guattari, F. and Rolnik, S., 1986, Micropolítica - Cartografias Do Desejo, Petrópolis: Vozes
Holmes, B., 2009, Guattari's Schizonanalytic Cartographies. Em: Continental Drift. (artigo) Disponível em <http://brianholmes.wordpress.com/2009/02/27/guattaris-schizoanalytic-cartographies> [Acessado 03/06/2013]
Jaboksen, J. (ed.), 2013a, Anti know Research Report. London: Flat Time House
________, 2013b, “The pedagogy of negating the institution” [Article] Mute Magazine (online). Available at <http://www.metamute.org/editorial/articles/pedagogy-negating-institution> [Accessed in March 10th, 2014]
Jakobsen, J. and Slater, H., 2002, “To Transfigure. To Organise”. [Text] Copenhagen Free University. Available at <http://www.copenhagenfreeuniversity.dk/trans.html> [Accessed July 18 Tedesco, S. (2008) Políticas da cognição, Porto Alegre: Sulina (pp. 93-112)
Kastrup, V., 2008, “A cognição contemporânea e a aprendizagem inventiva” in Kastrup, V.; Passos, E. Passos.
Kelly, S., 2010, Micropolitics and Transverlity: Language, Subjectivity, Organisation and Contemporary Arts Practice. Goldsmiths College, University of London (Thesis)
Lazzarato, M., 2008. As Revoluções do Capitalismo. Ed. Record, Rio de Janeiro
Lourau, R., 1993, Análise Institucional e Práticas de Pesquisa. Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de
Janeiro.
Molina, Marta Malo de, 2004, “Nociones Comunes, parte 2: del análisis institutional a experiencias contemporaneas entre investigacion y militancia”. (artigo) Disponível em: <http://eipcp.net/transversal/0707/malo/es> (acessado em 10/10/2017)
Maturana, H., 2001, Cognição, ciência e vida cotidiana. Belo Horizonte: UFMG.
O'Sullivan, S., 2006, Art encouters Deleuze and Guattari: Thought Beyond Representation. Hampshire, New York: Palgrave MacMilan
Pélbart, P.P., 2006, “Elementos para uma cartografia da grupalidade” [Article] Próximo Ato, Itaú Cultural, São Paulo Available at <http://www.itaucultural.org.br/proximoato2006/pdf/reflexoes/textopeterpelbart.pdf>
________, 2013, O avesso do niilismo – Cartografias do Esgotamento / Cartography of Exhaustion: Nihilism inside out. (bilingual edition portuguese/english) São Paulo/Helsinki: n-1 Edições
________, 2015, “What is the Contemporary?”. In: Afterall. no. 39. pp. 4-13 Rauter, C., 2015 “Clínica Transdisciplinar: Afirmação da multiplicidade em Deleuze/Spinoza”. In: Revista Trágica: estudos de filosofia da imanência – 1o quadrimestre de 2015 – Vol. 8 – no 1 – pp.45-56
Maia, A, 2015. Arte Veículo: intervenções na midia de massa brasileira. Recife: Editora Aplicação.
Malone, M. “What do I as an artist, provide?” (about Andrea Fraser) Mildred Lane Kemper Art Museum [May 11–July 16, 2007] , (panfleto)
Ribas, C. (org.), 2014. Vocabulário político para processos estéticos. Editora Aplicação, Recife/Rio de Janeiro.
Ribas, C., 2017. “Complexidade, Cartografia de”. Em: Indisciplinar. UFMG, Belo Horizonte. <http://blog.indisciplinar.com/sobre-a-revista-2/> (artigo) [acessado em 03/05/2017]
Ribas, C. 2013, 2014, Contemporâneo... recombinante. Em busca de uma recomposição imanente das práticas artísticas. Forum Permanente e In: Cava, B. e Cocco, G. Amanhã vai ser maior. São Paulo: Annablume, 2014.
Ribas, Cristina T. 2017. Research Processes, Knowledge Production and Processual Creativity: Schizoanalytic Cartographies in Brazil. Londres, Goldsmiths College University of London (tese)
Rodrigues, H., Leitão, M. B. and Barros, R. D. B. de, 1992. Grupos e Instituições em Análise. Editora Rosa dos Tempos, Rio de Janeiro.
Rolnik, S., 2010. “Entrevista: Suely Rolnik”. Em: CorpoCidade Plataforma. (entrevista) Disponível em <http://www.corpocidade.dan.ufba.br/redobra/r8/trocas-8/entrevista-suely-rolnik/> [Acessado em 18/11/2010]
Rolnik, S., 2011, Cartografia sentimental: Transformações Contemporâneas do Desejo. Porto Alegre, RS: Sulina, Editora da UFRGS
Rolnik. S. et al. 1998. Subjetividade Contemporânea – GT 33. VIII Simpósio Brasileiro de Pesquisa e Intercâmbio Científico. Available here: http://www.infocien.org/Interface/Simpos/An08T42.pdf [Access March 15th 2014]
Rosas, R. e Vasconcellos, G. Net.cultura. Digitofagia 1.0. São Paulo: Radical Livros, 2006.
Simondon, G. 2013. Imaginación e invención. Editorial Cactus, Buenos Aires
Stengers, I., 1997, Power and Invention: Situating Science. University of Minesota Press, Minneapolis
Sheikh, S., 2006. “Notes on Institutional Critique”. (artigo) Disponível em <http://eipcp.net/transversal/0106/sheikh/en> [acessado 15/05/2014]
Sheikh, S. 2009, “Objects of Study or Commodification of Knowledge? Remarks on Artistic Research”. In: Art & Research, vol. 2, no. 2. Spring 2009
Shukaitis, S & Graeber, D. (ed.), 2007. Constituent Imagination: Militant Investigations // Collective Theorization. Oakland/London, AK Press
Sites e plataformas (para ser atualizado)
Desarquivo.org
Midiatatica.info
Rizoma.net
http://desarquivo.org/node/1232
Universidade Nômade
Vídeos (para ser atualizado)
Félix Guattari, Entrevista (1h 15')
https://www.youtube.com/watch?v=E9jwK0_eDds
La Borde ou le droit à la folie (filme) (original francês, legendas em francês)
https://www.youtube.com/watch?v=iDh6mMTqORQ